Tradução

"O meticuloso exercício da escrita pode ser a nossa salvação" (Isabel Allende, em Paula)

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Trem noturno

      O filme começou a ser aplaudido assim que desceram os créditos. Estávamos na Casa da Cultura, assistindo a Trem noturno para Lisboa, do diretor dinamarquês Bille Augusto, no domingo (ontem). Se tivesse lido antes a crítica da Folha de S. Paulo (de Cássio Starling Carlos), talvez não tivesse ido. Felizmente não a li. Para Starling, "o filme é uma adaptação sem brilho do livro (de Pascal Mercier)", uma leitura "bem feita, mas sem brilho e sem vida", do processo de decadência da ditadura de Salazar. Ao contrário do crítico, achei o filme sóbrio, consistente, com atuações memoráveis de Jeremy Irons e Charlotte Rampling, sem falar em Martina Gedeck, cujo personagem desencadeia toda a trama.
      O roteiro acompanha um velho e solitário professor que certa noite, salva da morte uma jovem portuguesa (Martina Gedeck), quando esta tentava atirar-se de uma ponte em Berna, na Suíça. Inicia-se então uma jornada que o afasta de sua vida regrada e um tanto melancólica. Ele deixa para trás seus alunos, tendo como ponto de transição o momento em que leva a desconhecida para a escola e faz com que ela espere por ele sentada, em plena aula, sob os olhares perplexos dos alunos para aquela figura de cabelos desgrenhados e molhados de chuva. Quando a jovem foge, deixando no bolso do casaco do professor o livro de um autor português desconhecido, ele decide ir a sua procura em Lisboa, driblando os telefonemas assustados do diretor da escola, que perguntava sobre seu paradeiro.
     Procurando saber mais sobre a desconhecida (e sobre o autor do livro), o professor entra casualmente em contato com jovens participantes da Resistência, no momento político do final da ditadura de Salazar, numa saga de heroísmos e traições. Para Starling, o filme não decola porque o roteiro não conseguiu libertar-se do texto literário. Em minha opinião (de simples espectadora), a intenção não foi aprofundar-se nos subterrâneos da resistência a Salazar, mas sim acompanhar uma busca pessoal. Questão de ponto de vista. O público gostou, aplaudiu (quantos filmes podem dizer isso?). Sair do cinema com uma sensação de gratidão e completude não é pouca coisa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário