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"O meticuloso exercício da escrita pode ser a nossa salvação" (Isabel Allende, em Paula)

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Pitangueiras

      No canteiro central da avenida principal do bairro alguém havia plantado, muito antes de nós nos mudarmos para Paraty, uma amoreira. Quando chegamos, já era uma árvore adulta e frutificando. Pouco tempo depois, mão anônima serviu-se de alguns galhos dessa amoreira e plantou-os mais adiante. Eles "pegaram" e vão transformar-se em lindas árvores. Passando por lá dias atrás com A., em direção à padaria do bairro, descobri que as supostas pitangueiras que eu plantei há uns três meses não estão se portando exatamente como futuras árvores que deveriam ser: em vez de se aprumar verticalmente, como um tronco que se preze, seu caule continua fino e flexível e, estranhamente, logo começaram a lançar gavinhas tateantes, que, não encontrando onde se enrolar, ficaram por ali, muito retas, pesquisando o ar em busca de um apoio inexistente.
      - Desconfio que isso aí é pé de maracujá e não de pitanga, comentei com A., que garantiu, sem base alguma, serem pitangueiras. Respondi que as conheço muito bem: em São Fidélis, onde morei dos nove aos doze anos, havia uma no quintal na casa de meus pais. Eu adorava escalar aquele tronco liso e aqueles galhos meio escorregadios, com ligeiros despelamentos de uma casca fina e leve. O fio meio arroxeado que saía da terra, ali no canteiro central, não se parecia em nada com um tronco. As gavinhas que lançava precisavam urgentemente se enroscar em alguma coisa e produzir seus maracujás amarelos. Após muita discussão e diante das evidências, ele concordou. "Garantiu", porém, que, sendo maracujás, iriam se dar muito bem ali, já que, não encontrando onde se firmar, seus ramos iriam se espalhar alegremente pelo chão. Cheguei a rir, já que nunca ouvira falar de trepadeiras rastejando pelo solo e produzindo frutos debaixo das folhas, como se fossem abóboras!
      Hoje, passando pelo canteiro central, tive certeza: são pés de maracujá. Suas folhas lustrosas em nada se pareciam com as das pitangueiras cujas sementes eu havia plantado recentemente. O que deve ter ocorrido é que devo tê-lo feito há muito tempo, bem antes de lançar à terra as sementes das pitangueiras. As folhas têm o mesmo formato, só que as das pitangueiras são pequeninas e as do pé de maracujá bem maiores. Fui ao Google e achei fotos de folhas de maracujá iguaizinhas às que eu plantara, de dois tipos: com duas ou três divisões saindo do mesmo pecíolo, como as que plantei, e separadas uma a uma. Precisando urgentemente de um apoio para se desenvolver e não podendo eu construir caramanchões em canteiros da prefeitura, o jeito é transplantá-las para junto de alguma cerca ali por perto. A alternativa, que não aprecio, é deixá-las ali mesmo, para ver o que acontece.
      Para provar que não sou a única a plantar coisas em canteiros alheios, públicos ou não: outro dia, passando pela avenida onde estão os agora pés de maracujá, encontramos, A. e eu, uma jovem senhora a arrancar ervas daninhas do entorno do mesmo poste onde, cerca de dois meses atrás, fora flagrada por nós ensinando uma menina de seus oito anos a plantar. Nós nos apresentamos, mencionei o blog Guerrilla gardening, ela se interessou e, ao nos despedirmos, disse, animada: - Pode contar comigo! Ainda bem que descobri os guerrilla gardeners e uma vizinha também interessada nessas micro-questões, o que garante que não sou a única, estou em boa companhia!
      - Essa é da minha turma, eu disse a A., confortada.
     

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