Tradução

"O meticuloso exercício da escrita pode ser a nossa salvação" (Isabel Allende, em Paula)

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

As cores de Júlio

      No Café Paraty, no Centro Histórico, estão três quadros de Júlio Paraty. Encantei-me especialmente pelos que retratavam a vida caiçara: bandeirolas, barcos, figuras em dança, pequenas impressões de um forte estilo naif. Ou então uma figura única, geralmente ocupando o centro da tela, meio em reza, meio em festa. Cores: o azul, o amarelo, o vermelho, o branco. Certo dia, perguntei ao garçon o nome daquele pintor. Era Júlio Paraty. Lembrei de certa vez, nos distantes anos 80, em que entrevistei o compositor Guilherme de Almeida, também artista plástico, autor de competentes quadros naif. Nunca mais voltei à casa dele, num subúrbio do Rio, como prometera. O tempo passou, deixei o jornalismo, e, anos depois, soube de seu falecimento - que já ocorrera fazia tempo. Fiquei sem quadro dele.
       Sofro de uma síndrome muito comum: o adiamento das coisas que realmente importam. Mas isso não vem ao caso agora. Ou tem tudo a ver. O certo é que um dos garçons nos forneceu o telefone do artista. Certo dia, fomos a uma galeria de arte, das várias que há no Centro Histórico e lá fomos recebidos por uma figura alta e magra, muito falante e agitada. Quando perguntamos se era ele o autor dos quadros daquela galeria, ele disse que não: estava apenas "tomando conta" do local por algumas horas para o verdadeiro dono do lugar. E apresentou-se: Júlio Paraty, artista plástico, aquele mesmo, dos quadros expostos no Café Paraty. Como gosto de arte naif, guardei seu nome e pensei em ter um quadro seu.
      A partir de então, nós o encontrávamos por acaso, no centro comercial ou no Centro Histórico, às vezes a pé, às vezes de bicicleta. Fiquei de ir ver seus quadros, mas sempre acontecia alguma coisa e assim passaram-se os meses. Quando finalmente fomos à casa dele (no Caborê, bairro próximo ao nosso, perpendicular à estradinha que costumamos percorrer a pé, entre o Portal e o Centro Histórico), acabamos nos perdendo: entrando na rua Guapuruvus, atravessamos a pequena ponte sobre o canal e passamos direto da casa dele. Quando já estávamos longe, resolvi ligar de novo para perguntar. O artista foi nos esperar em cima da pequena ponte, onde já estava dando informações aos ocupantes de um carro que passava.
      Comprei dois pequenos quadros expostos na sala. Minha intenção era adquirir um grande quadro especial, com muitas embarcações caiçaras, bandeirolas e gente dançando, mas os que comprei também são lindos. Fica para o próximo ano. Já conhecia a trajetória do artista, mas ouvimos com prazer suas histórias. Júlio não nega a influência de Djanira, com quem conviveu quando esta morou em Paraty. Aos 18 anos, foi para São Paulo, onde fez sua primeira exposição (aliás, é o único artista paratiense catalogado no Dicionário dos Artistas Brasileiros, de Walmir Ayala, segunda edição). Paraty é pródiga em artistas plásticos: gosto muito também de José Andreas, Aécio Sarti e Lúcio Cruz, entre outros. E certamente adquirirei quadros deles também, um dia.

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